Já online a excelente reflexão de Ajahn Santikaro sobre a doutrina do kamma (skr.karma) e a tragédia no World Trade Center, quatro anos atrás: “Karma – Eles mereceram?” A reflexão, é claro, pode ser extrapolada para as várias tragédias da humanidade, como o terrível tsunami ocorrido na Ásia no final de 2004 e agora ao furacão Katrina na costa estadunidense, bem como às coisas mais particulares que nos acontecem. Um texto fundamental para a reflexão sobre o apropriado entendimento do kamma segundo a ótica buddhista, gentilmente traduzido por nosso amigo Samuel Cavalcanti. Na minha opinião, um dos textos mais completos sobre o assunto do kamma relacionado aos acontecimentos que nos ocorrem.
Eis alguns trechos:
“Este ensaio é endereçado aos buddhistas. Se eu estivesse falando para uma audiência de não-buddhistas, como o público em geral, eu não usaria explicitamente a palavra “karma” – a cultura popular já está confusa demais acerca do significado deste termo. Neo-buddhistas soltam-no por aí sem saber da tradição, aumentando a confusão. Usando-o no presente contexto, tornam-se possíveis muitos mal-entendidos. O Buddha-Dhamma oferece importantes abordagens sobre esta situação. O uso descuidado da linguagem e a repetição impensada de termos buddhistas não irão captar estas perspectivas de uma maneira significativa”.
“As coisas neste mundo têm as suas linhas causais e é possível que, de algum modo, estejamos mais ou menos conectados a elas. Nós não precisamos, entretanto, assumir que as conexões sejam próximas. Às vezes a conexão apenas aconteceu e não devido, necessariamente, a conexões diretas prévias. Tenham cuidado com o pensamento karma–pop que, de maneira simplista, diz que cada acontecimento feliz provém de alguma conexão kármica anterior – por exemplo, que encontrar um(a) cônjuge particularmente desejável seja resultado de relacionamentos em outras vidas. Por favor, pensem em tais idéias de maneira muito cuidadosa. Isto tudo leva a uma regressão sem fim a um profundo e infinito passado. Antes que vocês se dêem conta, vocês terão se fechado em um tipo de sinuca de bico cósmica desde um tempo sem início”.
“Se o nosso objetivo é participar do discurso social coletivo sobre o que aconteceu e quais as respostas que devemos dar, os meios hábeis seriam o de usar conceitos e linguagem que os não-buddhistas possam entender. “Karma” é um grande mal-entendido na cultura hegemônica, inclusive no Buddhismo hegemônico. Ao promover este termo nos arriscamos a remexer nesses mal-entendidos e carregar a discussão com confusões desnecessárias. Que termos e conceitos seriam úteis para uma abordagem buddhista? Isso requer outra questão, que abordagens são úteis nesta situação?“