É surpreendente que no meio dos praticantes do Buddhismo tibetano no Brasil ainda haja pessoas que não estão a par das controvérsias em torno da figura enigmática de Dorje Shugden, e, devido a isso, acabam frequentando centros buddhistas que pregam a prática de tal “divindade” ao mesmo tempo em que prestam tributo e homenagem ao Dalai Lama e ao resto das tradições tibetanas. O assunto é extremamente controverso, mas a posição do Dalai Lama, do governo tibetano em exílio e da parcela majoritária da tradição tibetana atual é inequívoca a esse respeito: aqueles que consideram o Dalai Lama como seu professor e que buscam nele refúgio e inspiração devem se manter afastados de lugares que postulam tais práticas.
No sentido de tornar ainda mais clara essa posição, no último dia 29 de junho, em Norbulingka, diante de uma assembléia de dirigentes e representantes dos maiores monastérios tibetanos, o Dalai Lama exortou que a condenação a tais práticas deve ser claramente chamada à atenção do público. Lobsang Nyima, diretor do setor de religião e cultura do governo tibetano, afirmou que é necessário demonstrar mais abertamente o suporte à limitação das práticas de devoção a Shugden, acrescentando: “a prevalecente timidez ou posição sobre este assunto pode ser muito prejudicial“.
A posição oficial do Buddhismo tibetano então é a de que a devoção a Shugden “alimenta o sectarismo entre as quatro diferentes tradições tibetanas e sua prática continuada contribui para a degeneração do Buddhismo“, uma posição que o Dalai reiterou em sua recente visita ao Brasil. Em minha última viagem à Índia tive o prazer de conhecer Samdhong Rinpoche, atual chefe do governo tibetano em exílio, na conferência internacional buddhista em Nalanda. Samdhong Rinpoche também esteve presente em Norbulingka e declarou que “quando a cadeia de transmissões orais é quebrada, isto se torna a maior causa para a eventual extinção do Buddhismo“. Uma importante exortação que os buddhistas que seguem o Buddhismo em sua versão tibetana devem refletir cuidadosamente.
tag: tibetano, budismo, buddhismo, shugden, Dalai Lama
Tem gente que não entende o que significa “caso resolva responder e continuar a conversa, por favor, coloque seu nome, do contrário simplesmente apagarei”. É como alguém que vem nos visitar em casa e não sabe se comportar. Não ficou claro na 1a. msg que não converso com anônimos? É curioso que alguém *exija* que a gente converse depois de deixarmos explícito que não dialogamos com quem nem ao menos é capaz de assinar o que defende. Estranho que tem gente que acha que se *inundar* o site com msgs anônimas vai nos forçar a dialogar nos termos dele e não nos do blog. É essa atitude infantil que faz com que prefiramos evitar conversar com quem não assina o que defende. Educação e maturidade é bom e a gente agradece 🙂
Olá Anônimo. Normalmente eu não respondo msgs anônimas. Acho bastante estranho que alguém emita uma opinião que peça por uma resposta, mas ao mesmo tempo omita intencionalmente seu próprio nome. Mas como essa msg levanta uma série de pontos que este blog sempre tenta ir contra (ou seja, a separação radical entre religião e política, a fé cega nas tradições e mestres, o sectarismo ilógico, etc), vou fazer um pequeno comentário. Mas caso resolva responder e continuar a conversa, por favor, coloque seu nome, do contrário simplesmente apagarei.
Seu post contém uma série de enganos. A começar com o “Praticar Dorje Shugden não é sectarismo e nem alimenta o sectarismo. Isso não tem lógica. Sectarismo é proibir que alguém faça uma prática.” Ora, não parece que vc conheça como surgiu a tal prática. Vc pode ver aqui: http://www.tibet.com/dholgyal
Basicamente, ela surgiu dentro dos Gelugpa como deidade irada para destruir os Nyingma, Kargyu e outras escolas. Se isso não é sectarismo, não sei o que posssa ser! Não é o DL que é sectário, pois ele não está promovendo uma prática que visa a destruição de outras escolas. Pelo contrário, o conehcimento das origens dessa prática mostra claramente que ela visava a oposição às escolas que não fossem Gelugpa.
O segundo ponto que vc levanta é que “Sectarismo é proibir que alguém faça uma prática”. Acho que vc não sabe qual é a definição de sectarismo. Em primeiro lugar, o DL não proibe tal prática. O que ele diz é que aqueles que prezam suas palavras não façam tal prática. Isso nada tem de sectarismo. Dentro da minha casa eu posso dizer para as pessoas tirarem os sapatos. Eu proibir as pessoas de entrar de sapatos não é sectarismo! Qualquer um pode proibir uma ação dentro de seu próprio domínio; e isso ocorre em todas as esferas da vida humana e não apenas na religião.
O terceiro ponto de sua msg diz que isso é uma questão política exclusiva do mundo tibetano. Bem, isso é o que aqueles que defendem tal prática usualmente afirmam. Eu pessoalmente discordo. No mundo de hoje, global e com míriades de práticas espirituais, defender uma prática que tem como origem a destruição de outras seitas, não é algo que possa ser colocado como fora do âmbito das discussões mundiais.
O quarto ponto que vc levanta é que “Logo, se a prática de Dorje Shugden é equivocada, TODO o budismo tibetano, pelo menos nos últimos 100 anos, está equivocado.” Isso é um raciocínio completamente falso, e mesmo absurdo. Tal prática sempre foi restrita a membros dos Gelugpa. Não tem o menor sentido dizer que se ela é equivocada então “TODO o budismo tibetano está equivocado”! A menos que vc pense que o budismo tibetano só é representado pelos Gelugpa (que aliás é o pto de vista dos promulgadores dessa prática em sua origem, ou seja, só quem é Gelugpa está correto). É exatamente contra isso que o DL (ele mesmo Gelugpa) quer se opor.
Seu quinto ponto equivocado é dizer que “Se o Guia Espiritual do Dalai Lama estava equivodado. Logo, a formação do Dalai Lama também está equivocada.” Isso só tem sentido para quem acredita que todos os mestres são perfeitos e acima de qualquer equívoco. Eu admito que alguns praticantes pensem assim. Eu da minha parte não acredito nem na infalibilidade papal nem na de qualquer lama ou mestre de que tradição religiosa que seja. E o fato desse ou aquele mestre ter entretido pontos errôneos também não aniquila toda sua prática e ensinamentos. Além disso, no Buddhismo há amplas razões para se pensar que tal infabilidade não possa ser sustentada. Além disso, se um mestre tem essa ou aquela crença errônea, isso não significa que por causa disso tudo que seus alunos fizerem estará errado.
O sexto ponto que vc levanta, qual seja, que o DL está errado em banir tal prática entre seus adeptos, vai contra o que vc mesmo escreveu anteriormente. Se vc acredita que mestres não podem errar, ou seja, que os mestres que adotaram a tal prática no passado não podiam estar errados ao fazê-lo, como que vc agora afirma que o DL pode errar?
Sinta-se a vontade para querer continuar essa conversa aqui, mas assine o que escreve, ok? Terei o maior prazer de discutir qualquer assunto, mas com pessoas reais e num espírito de camaradagem e clareza.
“Quando a cadeia de transmissões orais é quebrada, isto se torna a maior causa para a eventual extinção do Buddhismo”.
O Dalai Lama possui iniciação de Dorje Shugden. Seu Guia Espiritual praticava Dorje Shugden. O Guia Espiritual de seu Guia Espiritual também praticava Dorje Shugden.
Logo, se a prática de Dorje Shugden é equivocada, TODO o budismo tibetano, pelo menos nos últimos 100 anos, está equivocado. Se o Guia Espiritual do Dalai Lama estava equivodado. Logo, a formação do Dalai Lama também está equivocada.
Quem, então, quebrou a cadeia de transmissões (linhagem)?
Antes do Dalai Lama banir a prática de Dorje Shugden, as linhagens tibetanas viviam em harmonia. Praticantes e não-praticantes de Dorje Shugden viviam em harmonia. Hoje há a desarmonia. Essa desarmonia começou com as declarações do Dalai Lama. Isso é um fato.
ALGUNS Lamas, ALGUNS abades apoiam o Dalai Lama. Ele não é um consenso. Existem outros numerosos lamas e abades que apoiam a prática de Dorje Shugden.
O assunto é bastante controverso e complexo e só adquire sentido dentro da política tibetana (não devemos esquecer que o Dalai Lama também é um Chefe de Estado). Sem o referencial da dimensão política, a
“questão” Dorje Shugden não tem sentido. Dorje Shugden é um problema político interno ao Tibet. Problemas políticos não podem macular uma prática espiritual.
A única maneira de resolver essa questão é praticar os ensinamentos de nossa própria linhagem. Não devemos nos intrometer nos assuntos internos das linhagens dos outros. Se uma linhagem pratica Dorje Shugden, ela tem o direito de continuar praticando, pois é a sua linhagem. Se a minha linhagem não pratica Dorje Shugden, como eu posso opinar sobre algo que não diz respeito a mim, se não tenho conhecimentos suficientes, se não tenho “a transmissão oral dos ensinamentos”? Como falar do que eu não sei, por experiência?
A extinção do budismo pode vir de dentro do próprio budismo, quando as linhagens não mais se respeitam.
Praticar Dorje Shugden não é sectarismo e nem alimenta o sectarismo. Isso não tem lógica. Sectarismo é proibir que alguém faça uma prática. Quem quiser pode ver vários vídeos na internet que mostram o sofrimento de milhares de tibetanos (monges e leigos) que estão impedidos de praticarem Dorje Shugden. O 14º Dalai Lama não é um consenso na sociedade tibetana (como a mídia ocidental quer mostrar) e nem entre as diversas linhagens. Ele criou um problema político interno ao povo do Tibet com a proibição de Dorje Shugden, onde diversos lamas se colocam contra ou a favor. Isso mostra que não há consenso. Dizer-se surpreendido que praticantes brasileiros desconhecem essa disputa, para mim, não é correto. Essa disputa não é nossa, é interior à sociedade tibetana. Além disso, se somos budistas e praticamos disciplina moral temos que ter por objetivo a paz e a harmonia, em vez de apostar na divulgação daquilo que divide as pessoas.
Não é possível comentar.