Dias atras….
Lá fora o muezzin chama os crentes muçulmanos para a oraçao da noite. É um dos sons mais belos que existem no mundo, como se o universo abrisse a boca de sua profundeza e chamasse os homens para o louvor ao que é mais sagrado. É fácil entender, quando se escuta tal voz, como o Islam pode ser tão atraente. Ser chamado. É uma coisa séria. Para o que a verdade/realidade nos chama? Entupimos nossas vidas com tantos afazeres, desejos e superficialidades que perdemos completamente o contato com o chamado. Nem sabemos que isso existe.
Nestes dias tenho também escutado algumas palestras de um professor de vipassana por aqui, o mesmo que já citei uma outra vez. Um desses dias ele falou, entre outras coisas, da importancia de se contrabalançar a vida material com uma vida de constante busca pela profundidade. Em resumo, ele disse, precisamos nos fazer as perguntas: o que é o amor, o que é o soltar e todas as outras perguntas que levam a uma transformaçao. E citou de passagem o exemplo de Krshna e Radha da tradiçao hindu como exemplo de transformaçao pelo amor.
Agora, este é o modelo arquetípico do amor na Índia, e uma coisa interessante é que Radha era casada, e estava andando um dia, bem descontraída e nada procurando em especial, quando seu olhar cruza com Krshna. Krishna olha para ela, ela olha pra Krshna, e somente desse olhar nasceram séculos de expressao artística, milhares de poemas, cantos, esculturas de elevada arte que permearam a Índia com a noçao do “olhar”.
Qual é esse olhar que devemos buscar que nos eleva para além do cotidiano e da superficialidade, que consegue revelar para nós mesmos que somos outra coisa do que os outros pensam de nós ou que nós mesmos pensamos de nós; olhar que vê por trás das aparências e nos chama para a aventura da descoberta? Num sentido, todos buscamos cruzar com o olhar de Krshna (a realidade divina manifesta no mundo), o olhar que nos chama e incita, que nos desnuda e convida para superarmos nossos medos e pequenos desejos e juntar-se a Krshna na música que emana de sua flauta celestial. No encontro de olhares, que ambos não conseguem deixar de realizar e repetir, descobrimos um símbolo da atraçao que a verdade, na forma de liberdade, compreensao e amor, exerce naqueles que somente se colocam na posiçao apropriada para ouvir o chamado.
Esse olhar me parece com a pratica pessoal de cada um. Acho que tudo isso só trás motivação a continuidade da boa pratica
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Maravilhoso texto! 🙂
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