~ uma versão condensada da palestra de encerramento de Bhikkhu Bodhi no retiro de Dharma do Monastério Bodhi
O retiro está chegando ao final e logo teremos de ir para casa. Mas quando voltarem para casa, não pensem que vocês deixaram a prática do Dhamma para trás e não serão capazes de retomá-la até o ano que vem. Não dividam a sua vida em dois compartimentos: prática do Dhamma, algo que vocês fazem no monastério; e vida mundana, aquilo que vocês encaram quando abrem a porta da frente de suas casas. Vocês têm de reunir sua prática do Dhamma e sua vida. É quando sua vida se torna prática encarnada e sua prática se exprime em sua vida diária que vocês verdadeiramente entraram no caminho da prática do Dhamma em sentido próprio.
Em termos filosóficos, o Buddhismo faz distinção entre Nibbāna (skr. Nirvāṇa) e Saṁsāra. Nós pensamos o Nibbāna como o reino transcendente da liberdade e da paz definitiva, e o Saṁsāra como o reino da finitude e do sofrimento, como a escravidão da vida mundana. Com base neste entendimento, consideramos um retiro de Dhamma como uma grande oportunidade de deixar para trás nossos afazeres mundanos e dar alguns passos em direção ao Nibbāna, alguns passos mais perto da real pureza e sabedoria. Mas, se vocês entenderem essa distinção em termos absolutos, então, quando deixarem o mosteiro e voltarem para casa, poderão se sentir miseráveis por não querer enfrentar os problemas, pressões e obrigações da vida familiar.
Mas há outro modo de olhar a situação. No Buddhismo usamos frequentemente a imagem de uma flor de lótus crescendo na lama para ilustrar o processo de crescimento espiritual. A flor de lótus é o símbolo da beleza perfeita e pureza e, no entanto, ela cresce na lama no fundo do lago. Se não houvesse lama, a flor de lótus não poderia crescer; a flor de lótus não pode crescer num jardim bem preparado em terras secas. Somente na lama, na terra molhada do lago, é que a flor de lótus pode fazer crescer as suas raízes na lama e crescer atravessando a água do lago, centímetro a centímetro, até que atinja a superfície do lago. Então a flor se abre mostrando a sua beleza e fragrância para todos.
Essa imagem da flor de lótus crescendo na lama, subindo cada vez mais alto no lago até alcançar a superfície, simboliza a vida de um buddhista vivendo no mundo. A flor de lótus cresce da semente de lótus. A semente para o seu crescimento espiritual é a fé forte na Tríplice Jóia: o Buddha, o Dharma e a Sangha. Como uma semente, a fé tem o potencial de se transformar em uma linda flor de lótus, a flor da mente iluminada. E o que alimenta a semente é a sua vida dentro do mundo, suas experiências cotidianas. Com a orientação do Dhamma, você pode aprender as habilidades necessárias para integrar o seu dia a dia com o caminho da iluminação e da libertação. Ao fazer isso você vai dar verdadeiro sentido para a sua vida. Significados entram em nossa vida quando buscamos um objetivo que é realmente bom. O Buddha fala em dois tipos de bem – o próprio bem da pessoa e o bem dos outros – e ele diz que nós aproveitamos a mais significativa vida quando nós dedicamos nossos esforços para realizar estas duas partes do bem. Então, em sua vida diária, você deve prestar atenção em ambos para atingir o seu próprio bem e para promover o bem para os outros.
O Buddha fala de dois tipos de bem – o bem próprio e o bem de outros – e ele diz que nós aproveitamos a mais significativa vida quando dedicamos nossos esforços para preencher este duplo bem. Então, em nossa vida diária, vocês devem dar atenção para ambos, alcançar seu próprio bem e promover o bem de outros.
Vocês promovem o seu próprio bem, comprometendo-se com a prática sincera do Dhamma. Há três importantes esferas na prática buddhista: a devoção, o estudo e a meditação. Devoção é o cultivo do lado emocional da nossa vida. Conduz as emoções por canais espiritualmente benéficos, inspirando a vontade, despertando as nossas aspirações, estabelecendo as nossas determinações. Como a gasolina está para os carros, a devoção fornece a energia que faz do estudo e da meditação canais para o progresso do Dhamma. O estudo é necessário para aguçar o nosso entendimento dos ensinamentos de Buddha, desenvolver a sabedoria; mas o estudo sem a prática não conduzirá à realização. Assim, para transformarmos o que aprendemos, através do estudo, numa verdadeira realização, temos de praticar meditação, bhāvanā. A meditação purifica a mente e permite-nos ver com um insight direto a verdade do ensinamento, a verdade de todos os fenômenos.
Enquanto você vive a sua vida familiar, respondendo às suas responsabilidades familiares, você deve dedicar certos períodos de tempo durante o dia à sua prática do Dhamma: para as devoções, o estudo sério dos ensinamentos do Buddha e o cultivo mental. Você deve também manter um contato regular com um monastério. Tudo isto soa a conversa de vendedor, mas não é assim. É para o seu próprio bem ter contatos regulares com pessoas sábias e conselheiros compassivos, que podem guiá-lo, explicar os aspectos difíceis e ajudá-lo a cultivar o caminho.
Até agora eu falei sobre realizar seu próprio bem, mas vocês também devem dar atenção ao bem dos demais. Uma maneira de fazer isso é a prática da generosidade. Aqui na América nós vivemos em uma sociedade muito abastada. Devemos considerar os bilhões de pessoas neste mundo vivendo à beira da inanição, à beira da pobreza, à beira da miséria e desespero. Devemos ajudar a aliviar sua pobreza em qualquer medida que possamos e contribuir de forma concreta para resgatá-los da miséria.
Vocês também podem contribuir para o bem dos outros ajudando o próprio monastério. Os monges querem usar seu tempo para estudar o Dhamma numa maior profundidade de modo que possam partilhar o Dhamma com outros, podem partilhá-lo com vocês, e assim vocês também colherão os frutos do caminho. Mas para ter tempo e oportunidade para estudar o Dhamma em profundidade, realmente precisamos de ajuda – ajuda física e apoio moral.
Eu acho que o Monastério Bodhi tem o potencial de fazer uma contribuição poderosa e efetiva para a disseminação do Buddhismo na América do Norte. Mas, para que este monastério tenha sucesso, nós vamos precisar de uma cooperação estreita e harmoniosa entre os monásticos e a comunidade leiga afiliada. Então, vamos todos juntar as mãos para fazer do Monastério Bodhi um verdadeiro local Bodhi (de Despertar) para estudar, praticar e compreender os ensinamentos do Buddha.