por Dipen BD
As tradições buddhistas frequentemente celebraram líderes, tanto no governo quanto fora dele, que se tornaram buddhistas. É por isto que o imperador mauryan, Ashoka (coroado entre 268 e 232 AEC) é visto não somente como um dharmaraja (um rei que governa por meio do Dharma), mas o mais próximo do que se pode ser de um legendário chakravartin – título que denota um rei que gira a roda do dharma, e que ativamente dissemina a mensagem buddhista. Na Era Comum, Huvishka, um imperador simpatizante do buddhismo do império Kush (30-375 EC) recebeu o título leigo de “estabelecido no Mahāyāna” (Mahāyāna-samprasthito) em um fragmento de manuscrito em sânscrito localizado na Coleção Schøyen em Oslo.
Há tempos os textos buddhistas se preocupam com liderança porque sempre existem líderes no contexto da comunidade. Portanto, a sangha estava preocupada, desde o começo, com os vários tipos de liderança que o buddhismo abrange: desde a sangha até a residências e vilas, e obviamente em um nível governamental.
Instruções ou declarações sobre sociedade, política e economia são encontradas em algumas das escrituras buddhistas antigas, incluindo o Mahāhamsa Jataka do Khuddaka Nikāya. De acordo com o Mahāhamsa Jataka, um líder deve ser responsável, honesto e disposto a fazer sacrifícios quando preciso. Essas qualidades são descritas em seguida como a virtude das dez vezes, também conhecida como “virtude real das dez vezes” (dasa-rajadhamma): generosidade, moralidade, auto sacrifício, honestidade, gentileza, autocontrole; não-ira, não-violência, tolerância e integridade (dānam sīlam pariccagam, ajjavam maddavam tapam; akkodham avihimsanca, khantinca avirodhanam).
Generosidade (dāna) no contexto de liderança significa que deve-se dispor integralmente àqueles pelos quais são responsáveis. O líder está preparado para sacrificar o seu próprio prazer para o bem-estar das pessoas, doando seus pertences e ajudando o desenvolvimento humano, tanto material quanto não-material. Generosidade é seguida pela moralidade (sīla), que é o caráter moral que consiste em três aspectos: físico, mental e vocal. Auto sacrifício (paricagga) é evitar o egoísmo e praticar altruísmo para o bem-estar alheio. Um líder deve estar disposto a sacrificar seu prazer pessoal ou interesses como conforto, nome e fama. Honestidade (ajjava) significa sinceridade, autenticidade, integridade mental. Essa atitude é um tipo de ausência de medo ou favor. Gentileza (maddava) possui a qualidade de ter uma atitude bondosa e gentil, expressando-a em atos cotidianos, como bons costumes. Líderes oferecem-se, pensando duas vezes antes de exigir de outros.
Autocontrole (tapa) familiariza o líder com uma vida de (relativa) simplicidade, não sendo controlado por suas vontades, emoções e desejos, para assim recusar sua participação em prazeres. A característica dessa qualidade é pacificar seu ego e orgulho realizando suas tarefas sem indolência. Ele não deve escolher uma vida luxuosa ou consumir recursos de forma exagerada. Não-ira (akkodha) significa permanecer calmo mesmo ao ser insultado ou repreendido. A qualidade dessa virtude é misericordiosa e amigável, acima de intenções malignas, hostilidade ou ódio, permanecendo calmo diante provocações.
Não-violência (avihimsa) não machuca outras pessoas, mantém uma atitude de bondade, é feliz e pacífica, evita todas atitudes de violência e destruição à vida. Tolerância (khanti) é paciência frente a obstáculos e dificuldades, sem hesitar em servir ao bem público. Um líder deve ser humildade ao se deparar com insultos, dando espaço a compreensão e sabedoria ao fazer escolhas. Integridade (avirodhana) ou não-confronto é não se opor e não obstruir a vontade do povo. Um líder deve ajudar as pessoas a fazer progresso de acordo com seus propósitos e ideais de liderança.
Um bom governo canaliza os talentos e as ambições das pessoas para alcançar metas nacionais, desenvolvimento sustentável e justiça social. Um aspecto de um bom governo é ser um administrador apropriado da economia do país e de recursos sociais para o desenvolvimento. Um líder que tem caráter moral também é um exemplo para as pessoas, que podem perceber como emular seu caráter pode fazer diferença em suas próprias vidas cotidianas.
No Cakkavatti Sihanada Sutta de Dīgha Nikāya, o Buddha é dito ensinar sobre desigualdades econômicas que dividem o mundo entre ricos e pobres. O sutta identifica o problema básico do estado como fornecimento de alimentos, que deve ser resolvido antes de todos os problemas subsequentes serem resolvidos. Existe uma história sobre um ladrão que foi pego e levado ao rei. O ladrão explicou que ele simplesmente roubou a riqueza de outros porque ele era pobre. Então, o rei deu dinheiro a ele, dizendo-lhe para abrir um negócio. Logo, outras pessoas decidiram roubar algo para receber o mesmo tratamento pelo rei. No entanto, dessa vez o rei ordenou que os ladrões fossem executados. O líder deve, portanto, estar apto para discernir a diferença entre intenções e possíveis resultados de tais intenções.
O Buddha explicou a moral dessa história: “Então, de não conferir propriedade aos necessitados, a pobreza tornou-se abundante, do crescimento da pobreza, a prática de pegar o que não foi dado aumentou, do aumento dos roubos, o uso de armas aumentou, do aumento de uso de armas, as mortes aumentaram, e do aumento das mortes, a duração de vida das pessoas e sua beleza diminuíram”. (Walshe 1995, 399).
O Kutadanta Sutta de Dīgha Nikāya fala de um rei, Mahāvijita, que queria organizar um sacrifício em larga escala para assegurar seu conforto pessoal e bem-estar. No entanto, seu ministro-chefe aconselhou a não fazê-lo: “Se Vossa Majestade cobrasse impostos dessa região, seria errado. Supondo que sua Majestade pensasse: ‘Eu vou me livrar dessa praga de ladrões através de execuções e encarceramento, ou através de confisco, ameaças e banimento,’ a praga não acabaria, de fato’. O ministro-chefe então ofereceu uma solução: ‘Àqueles que no reino residem e estão comprometidos em cultivar colheitas e criar gados, deixem Sua Majestade distribuir grãos e forragem, àqueles que vivem do comércio, dar-se-á capital, àqueles que servem o governo, dar-se-á salários apropriados”. (Walshe, 1995, 135) O rei seguiu essas três instruções e deu o que era necessário e relevante às pessoas.
A política ao redor do mundo está sendo abalada e desestabilizada por forças além do controle dos líderes nacionais. As virtudes reais das dez vezes podem agir como um fator decisivo em todas as áreas de interesses pessoais. Como um líder da comunidade ou do país, seus ideais inspiradores guiam as pessoas a viverem felizes e saudáveis. Portanto, o bem-estar de uma nação depende fortemente de ações tomadas por seu líder, e o líder deve se basear na virtude.
Referências
Walshe, Maurice. 1995. The Long Discourses of the Buddha: A Translation of the Digha Nikaya. Boston: Wisdom Publications.
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Traduzido por Gabriela de Grazia
do original ‘When Leaders Set Forth on the Path: Qualities of a Dharmaraja‘ em acordo com os editores
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© 2018 Edições Nalanda
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