29 anos atrás, em 16 de janeiro de 1992, morria Luang Por Chah Subhaddo, mais conhecido como Ajahn Chah, um dos grandes mestres buddhistas da Tailândia. Nascido em 1918 na região nordeste da Tailândia numa família de humildes agricultores, aos nove anos ele se tornou noviço, como era comum na cultura da Tailândia. Ele não permaneceu por muito tempo pois precisou ajudar seus pais nos campos, mas oito anos depois finalmente tomou os votos monásticos completos. Sete anos depois ele resolveu seguir uma vida mais ascética como andarilho, tendo oportunidade de conhecer diversos professores enquanto vagava pelos vilarejos do nordeste, dormindo em cavernas e regiões de floresta virgens.
Ajahn Chah e Ajahn Buddhadāsa foram bons amigos, com grande respeito um pelo outro. Era comum alunos de ambos visitarem os mosteiros do outro, uma vez que tinham uma perspectiva semelhante quanto ao Dhamma apesar de terem abordagens bem diferentes. Ao contrário de Ajahn Buddhadāsa (doze anos mais velho), o qual incentivava a vida na natureza combinada com um estudo profundo das escrituras e uma dedicada investigação do Dhamma na vida diária, Ajahn Chah colocava grande ênfase no seguir o vinaya, o código monástico, como ferramenta fundamental do treinamento de si mesmo. Viver o dia a dia com meditação e disciplina era sua mensagem principal.
Com a fundação em 1954 de Wat Nong Pah Pong, um mosteiro na região de Ubon Ratchathani, Ajahn Chah teve a oportunidade de aplicar este treinamento de vida simples e meditativa de uma maneira mais estável, diferente dos anos anteriores de uma vida mais árdua de constante movimentação e privações típicas da vida andarilha. Nove anos depois, bem perto de lá, ele fundaria Wat Pah Nanachat, um mosteiro seguindo os mesmos princípios, porém dedicado exclusivamente à crescente comunidade estrangeira de pessoas interessadas no buddhismo mais meditativo.
Acredito que eu deva ser um dos poucos brasileiros (nunca fiquei sabendo de nenhum outro) que tenha conhecido Ajahn Chah pessoalmente. Wat Pah Nanachat na época era um lugar bem simples, onde se podia ter uma vida meditativa tranquila. Os primeiros três dias serviam como “período de visitação”, mas depois disso era preciso usar roupas brancas e raspar os cabelos. Era possível ocasionalmente ter conversas e entrevistas com monges sêniores, mas o dia a dia não era grandemente estruturado. Meditar no decorrer do dia e das atividades rotineiras era o fundamental. De lá também se podia visitar Luang Por, que ficava em Wat Nong Pah Pong logo ao lado. Sempre me lembrarei dos encontros de grupo à tarde, onde monges e praticantes laicos se sentavam juntos para um tipo de “chá da tarde”, onde se conversava sobre o Dhamma enquanto bebericando um suco de laranja quente, algo estranhíssimo no início, mas que vamos nos acostumando e até gostando com o tempo. “Nosso Verdadeiro Lar”, uma palestra de Ajahn Chah, foi traduzida nessa época, acredito que a primeira tradução em português de sua autoria.
Ajahn Chah foi uma influência decisiva em minha passagem do Zen/Terra Pura para o Theravāda. O contato com seus ensinamentos, que ocorreu dentro de um mosteiro de zen coreano, possibilitou um vislumbre de um caminho que me parecia completamente diferente daquele com o qual estava acostumado no buddhismo do Brasil. Isso me levou logo em seguida a entrar em contato com a meditação vipassanā na linhagem de S.N. Goenka (que anos mais tarde trouxe pela primeira vez ao Brasil) e com Mahā Ghosananda, patriarca do buddhismo cambojano, o que selaria minha entrada na tradição antiga.
É motivo de grande alegria para mim poder oferecer uma crescente seleção de palestras transcritas de Ajahn Chah, que podem ser encontradas aqui: Os Ensinamentos de Ajahn Chah. Que sejam para o benefício de muitos!
A simplicidade da abordagem de Ajahn Chah também me cativou, sendo que a oportunidade do contato foi proporcionada pelo Nalanda. Muito obrigado pela generosidade de todos os envolvidos.
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