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Não-Dualidade IV

Prosseguindo com o tema da não-dualidade, temos então que uma das conseqüências da adoção do ponto de vista não-dual, tal qual geralmente exposto, recai sobre o lugar da moralidade no caminho espiritual. Enquanto que em ambas as visões a moralidade é vista como base necessária de estados superiores a serem desenvolvidos, numa visão não-dual a moralidade, a partir de um certo ponto, se transforma em “perigo”, um obstáculo ao caminho. Nesse nível “mais alto” a moralidade passa a ser vista como prática inferior, justificando nomeações como “hinayana” (‘caminho desprezível’) para caminhos que não adotam tal visão não-dual.

No Buddhismo Theravada, entretanto, ao mesmo tempo em que sila é tomada como um estágio inferior, por outro lado não se desenvolve em relação a ela esse sentimento de um certo desdém. Se alguém somente quer praticar a virtude e a moralidade, mas não sobe para os estágios seguintes de samadhi e panna, ela é claramente um obstáculo, mas não nos apressamos em classicar o indivíduo que assim se comporta de ‘inferior’. Ainda, o indivíduo que prossegue aos estágios superiores não abandona a moralidade já praticada, ao contrário do que frequentemente se escuta de praticantes que crêem na não-dualidade. Se dizemos que o Buddha ensina o Tríplice Treinamento, alguém que pratica só um dos três claramente está reduzindo sua prática e o Canon Pali está repleto de admoestações do Buddha contra o praticar apenas a virtude. Mas isso não implica que nos estágios superiores abandona-se a moralidade, sob pena de transformar o Tríplice Treinamento num ‘treinamento duplo’ (ou seria dual?)

A virtude ou moralidade não é um obstáculo no sentido que sua própria existência, independente de se estar apegado a ela ou não, é um obstáculo e, assim, deve ser abandonada num certo momento. Para o Theravada, desde que não haja apego e se fique estagnado num estágio, ela simplesmente não é um obstáculo. Pelo contrário, o obstáculo está na mente e não na virtude em si.

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