O futuro de nossa juventude

Crianças meditando. De genpsych.com
Crianças meditando. De genpsych.com

Por Buddhistdoor [1]

O que quer que se pense sobre a política de controle de armas nos EUA, a Marcha para Nossas Vidas, liderada por jovens, que aconteceu em 24 de março, destacou a incrível energia, eloquência e rigor intelectual dos jovens, especialmente quando estão apaixonados por questões importantes como a situação econômica e seus futuros. Como os jovens constituem literalmente o futuro da nossa sociedade, não devemos subestimá-los ou negligenciá-los. Eles são a chave de um futuro viável para qualquer instituição, seja um país, uma comunidade religiosa ou uma família. É fundamental, portanto, que eles recebam orientação sólida, produtiva e empática.

Ainda assim, apenas conselho não é suficiente. Eles precisam ter espaço para explorar suas vocações, desenvolver suas habilidades e se expressar dentro das comunidades buddhistas. Só então serão capazes de se engajar e abraçar as oportunidades e responsabilidades da liderança e, mais importante, explorar e pensar sobre o buddhismo de forma relevante para sua geração.

A ação da juventude contra a violência armada nos EUA coincide com algumas tendências interessantes relativas ao buddhismo estadunidense. Embora constitua apenas uma fração de fiéis no país (existem apenas 800 mil pessoas praticando o buddhismo na Califórnia, por exemplo), o buddhismo é a única religião que consegue atrair jovens convertidos — em 2007, 23 por cento dos buddhistas estavam na faixa de idade entre 18 e 29, mas 10 anos depois esse número era razoavelmente encorajador, 34 por cento (Pew Research Center). Um acadêmico da Universidade de Berkeley, Layne R. Little, afirmou que o buddhismo ganhou este novo terreno graças a uma percepção pública do Dharma como um ensinamento pragmático, focado em entender a natureza da mente e a condição humana e em aliviar o sofrimento.

É verdade que, com o mundo em um estado cada vez mais instável e incerto, um número crescente de organizações buddhistas parece sentir que é essencial uma abordagem engajada ou humanista da fé e da prática, combinada com um interesse pela sociedade. Os defensores do buddhismo engajado/humanista carregam essa chama há muitas décadas. Eles vêm de diversas tradições e regiões do globo, de Bhikkhu Bodhi a Thich Nhat Hanh, passando pelo Mestre Hsing Yun. Mas essa manifestação do buddhismo, como muitas outras, precisa da paixão, criatividade e engenhosidade dos jovens para sustentá-la, especialmente quando o mundo avança em direção a novos problemas. Quando se permite aos jovens o pleno desenvolvimento de seu potencial de bodhisattva, os benefícios obtidos pela sociedade como um todo são muito maiores.

Os jovens e as instituições precisam trabalhar juntos para se compreenderem e se abrirem uns aos outros. Essa relação mutuamente benéfica poderia muito bem ser a chave para curar o sofrimento e a ansiedade de muitos jovens de hoje e poderia injetar vida nova e perspectivas em nossas estruturas convencionais. Os jovens de hoje estão imersos, via internet e mídias sociais, em uma economia de conhecimento globalizada. Visto que as informações sobre religião desses jovens não vêm simplesmente de seus pais, professores ou comunidade local, e que eles estão cercados por vozes contrastantes (nem todas favoráveis à religião), assim não farão automaticamente a conexão entre a fé religiosa e as instituições que professam autoridade espiritual.

Enquanto encorajamos os jovens a explorar a tradição buddhista, acreditamos que ela não necessariamente (nem deveria ser) tenha as mesmas ênfases doutrinárias das gerações passadas. Isso ocorre porque o buddhismo, apesar do núcleo imutável do Dharma, está constantemente respondendo às necessidades de evolução de diversas sociedades em todo o mundo.

Em 2016, o mestre zen Thich Nhat Hanh escreveu uma carta detalhada aos jovens sobre formas de prática religiosa das quais não se beneficiariam e, em sua opinião, precisavam evitar: “A religião, para a maioria das pessoas, é pouco mais do que um conjunto de costumes e rituais de família e da sociedade. Por preguiça ou falta de interesse, muitos estão satisfeitos com uma compreensão superficial de sua religião. Eles não examinam a verdade dos ensinamentos à luz de sua própria experiência, muito menos praticam esses ensinamentos para melhorar e curar a si mesmos. Esse tipo de pessoas é mais propenso a expressar dogmatismo e intolerância” (Plum Village).

Em vez disso, Thich Nhat Hanh aconselha os jovens que a religião, além de ser sobre algo maior que eles próprios, também significa uma jornada intensamente pessoal que precisa ser um diálogo interior constante. “Se você segue uma religião, não seja como aqueles mencionados acima. Estude sua religião de maneira inteligente, em toda a sua profundidade e beleza, para que ela possa nutrir sua vida espiritual. Uma religião saudável é uma religião viva. Deve ser capaz de evoluir e aprender a responder às dificuldades do nosso tempo. A religião deve servir a humanidade, não a humanidade à religião. Não permita que ninguém sofra ou perca a vida em nome da religião” (Plum Village).

Com todas essas considerações em mente, o que os jovens do buddhismo devem esperar? Eles devem esperar um buddhismo que seja autoconsciente, que não os trate como ignorantes e esteja disposto a explorar abertamente como os conceitos tradicionais devem ser compreendidos.

Por exemplo, o que a vigilância (mindfulness/consciência plena) significa na era da mídia social e nas reações e julgamentos instantâneos? Como alguém pode abraçar toda a gama de experiências emocionais pelas quais passa na adolescência (e na vida em geral) enquanto pratica autenticamente o desapego? Não podemos dar as respostas neste momento. No entanto, são as escolas e professores que, envolvendo a juventude, estão dispostos a explorar tais questões oportunas que irão expressar verdadeiramente a atemporalidade do buddhismo.

O mundo parece mais imprevisível do que nunca. As mudanças climáticas ameaçam o futuro da humanidade. Esta é a era do domínio das grandes corporações e da tecnologia de dados. Os desafios que nossos futuros professores, líderes e curadores vão enfrentar serão significativos. No entanto, se as instituições e líderes espirituais apoiarem nossa juventude e vice-versa, não há nada que não possam realizar juntos.

[1] https://www.buddhistdoor.net/features/contemplative-practices-helping-children-enjoy-meditation


Traduzido por Benedito Inácio da Silveira para o Centro de Estudos Buddhistas Nalanda
em acordo com os editores
Para Distribuição Gratuita
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Este é o blog pessoal de Ricardo Sasaki, psicoterapeuta, palestrante e professor autorizado na tradição buddhista theravada (Upasaka Dhanapala) e mahayana (Ryuyo Sensei), tradutor, autor e editor de vários livros, com um grande interesse na promoção e desenvolvimento de meios hábeis que colaborem na diminuição real do sofrimento dos seres, principalmente aqueles inspirados nos ensinamentos do Buddha. Dirige o Centro de Estudos Buddhistas Nalanda e escreve no blog Folhas no Caminho. É também um dos professores do Numi - Núcleo de Mindfulness para o qual escreve regularmente. Para perguntas sobre o buddhismo, estudos em grupo e sugestões para esta coluna, pode ser contactado aqui: biolinky.co/ricardosasaki

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